HOSPITAL DOS COVÕES:
DA LINHA DA FRENTE
PARA O FIM DA LINHA
Coimbra é
referência para a saúde da Região Centro, com 2.230.000 pessoas, tem uma
Universidade grande, uma Faculdade de Medicina grande, várias escolas de vários
tipos e graus ligadas à saúde, vários institutos de investigação nessa área, e,
por isso, tem muitos profissionais de saúde, formados e em formação, e muitos
doentes. E, naturalmente, vários hospitais. Entre eles dois Hospitais Gerais
Centrais, existindo e coexistindo há quase 50 anos, e constituindo a tal
referência para a Região Centro em matéria de hospitais centrais, com a
tecnologia e os recursos humanos necessários, fim de linha na referenciação de
doentes desta Região.
Por lei de 2011
fez-se a fusão dos dois hospitais centrais: do HUC com o CHC (fundado em 1973,
Hospital dos Covões, Maternidade Bissaya Barreto e Hospital Pediátrico), dela
resultando o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Que, ao contrário do
que o nome diz, não é um centro hospitalar, antes tem sido entendido como um
hospital único com várias instalações espalhadas pela cidade a quilómetros de
distância umas das outras. Nesta conformidade, o conselho de administração
tem-se esforçado por concentrar todas as valências de hospital geral central no
HUC, a pouco e pouco esvaziando de recursos humanos e de serviços o Hospital
dos Covões. Felizmente a tecnologia lá instalada permanece, com Unidade de
Cuidados Intensivos, Hemodiálise, Unidade de Cuidados Intensivos Coronários,
Unidade de Hemodinâmica, Serviço de Urgência, Bloco Operatório, Geral e de
Ambulatório, TAC, Ressonância Magnética Nuclear… porque foi isso que lhe
permitiu ser o Hospital de Referência para covid-19 em Coimbra e na Região
Centro. Função de que se saiu muito bem, mostrando toda a capacidade que tem
como Hospital. E que é, convenhamos, o que o tem tornado difícil de matar,
apesar dos continuados esforços nesse sentido…
Da acumulação de
tudo no HUC resultou o seu superpovoamento, em doentes e funcionários (nas
mesmas instalações de há já 33 anos), a sua falta de resposta atempada, com
listas de espera cada vez maiores para consultas, exames e cirurgias (em grande
medida escoadas para as clínicas privadas), taxas de infecção hospitalar
proibitivas (que já levaram ao encerramento temporário de serviços), tempos de
espera de 8 e 10 horas na Urgência, sobrecarga do pessoal. Tudo isto
acompanhando a progressiva desactivação do Hospital dos Covões.
Esta situação tem
sido exposta repetidamente, perante a passividade de quem não a devia ter. Esta
indiferença levou mesmo, mais recentemente, a uma Petição pública, contestando
essa gestão do CHUC (que nunca foi explicitada em qualquer plano director, aliás)
e pedindo a autonomia de gestão para o Hospital dos Covões, devolvendo-o aos
seus doentes de tantos anos, à cidade e à Região. Deixando de ser uma espécie
de casa da quinta do outro, que serve para arrumar o que não se quer ou de
momento não se pode acomodar noutro lado. Porque, obviamente, há necessidade de
dois Hospitais, e não de um com um acrescento.
Tudo em vão. E
agora ultrapassou-se o limite. O conselho de administração do CHUC, depois de
três meses do Hospital dos Covões na linha da frente a lutar contra a pandemia
de covid-19, como Hospital de Referência, propôs-se encerrar a Urgência desse
Hospital. A ARS Centro contrapôs mantê-la aberta como... Urgência Básica! Quer
dizer, com os mesmos recursos da urgência duma clínica privada ou dum hospital
concelhio! Quando a Urgência do HUC está
absolutamente assoberbada, e as Urgências de Coimbra são o fim de linha de toda
a Região Centro. Se isto for por diante, resta desejar felicidades aos doentes
que forem ao HUC e a quem lá trabalha!
A única explicação
razoável para isto tudo é economicista, e errada. Porque outra seria um
“clubismo” hospitalar bacoco, que a existir seria demasiado mau… Fiquemos pelo
economicismo. É simplesmente o governo não querer gastar dinheiro na Saúde. E o
erro da medida advém do facto de fundir dois Hospitais que fazem falta em um
único insuficiente não trazer vantagem económica nenhuma, para além de ser uma
quebra grande na prestação de cuidados de saúde às populações. Mas a verdade é
que o extremo que esta última decisão constitui deixa antever uma atitude de
austeridade, que é negada mas parece vir a caminho. Uma austeridade provocada
por problemas económicos resultantes do combate à pandemia, e aplicada antes de
mais no hospital que ajudou, e decisivamente, a lutar contra ela! Se não fosse
trágico, até tinha graça! Esperando que ela se esteja a ir embora… e não volte…
nem ela nem outra… Porque se isso
acontecer, e sem o Hospital que recebeu o embate, lá terão os doentes de se
misturar com outros num mesmo hospital superlotado ou, não cabendo, em camas em
pavilhões desportivos, ou em tendas de campanha montadas à porta do
hospital… É o que se chama ter vistas
largas em saúde…
In Diário As Beiras on-line, 9 de Junho de 2020
Sem comentários:
Enviar um comentário