MAIS UMA… ATÉ QUANDO?...
Tantas manifestações populares, nas ruas
(já é a quarta) e no Facebook, com uma página dedicada que vai com mais de
35.000 membros; uma petição pública à Assembleia da República com 4500
assinaturas (porque 4000 é o número mínimo para ser aceite, fossem necessárias mais
e mais seriam), em apreciação pela Comissão Parlamentar de Saúde e posterior
votação em plenário (como já houve duas outras anteriormente); declarações
públicas, orais e por escrito, repetidas, das várias forças políticas na
cidade, incluindo do partido no governo, bem como de Câmaras Municipais e
Juntas de Freguesia, isoladas e em associação; interpelações à ministra da
saúde sobre o tema por deputados de partidos da oposição, incluindo componentes
da Comissão de Saúde. Tudo no mesmo sentido. Tudo em vão até agora.
Poder-se-á compreender um dia esta
indiferença absoluta do ministério da saúde e do governo?! Porque não se trata duma
cidade que quer ter mais um pavilhão gimnodesportivo e o governo não pode ceder
a essas exigências!… Ou dum problema laboral numa empresa cuja responsabilidade
é apenas da gerência… Trata-se dum Hospital Geral Central existente e
totalmente equipado e funcionante desde 1973, com provas dadas e qualidade
reconhecida, que tratou com eficiência milhares de doentes e formou milhares de
profissionais! E que querem simplesmente desmantelar! Onde se tratou a primeira
onda de Covid-19 em Coimbra… e agora se desactiva antes que a segunda chegue… Como
se não fizesse falta, e pudesse ser substituído pelos vários hospitais
privados, franchisings de várias marcas, entretanto construídos em
Coimbra!!
A par disto assiste-se ao outro Hospital
Central em Coimbra, o Hospital da Universidade de Coimbra, onde se concentrou
tudo e todos, completamente assoberbado, bloqueado no acesso rodoviário e no
estacionamento, mas sobretudo no trabalho que tem e na quantidade de pessoas que
por ele circulam, com a resposta cada vez mais difícil, com aumento enorme das
listas de espera para consultas, exames, tratamentos médicos e cirurgias, apesar da
exaustão de quem lá está e se esforça. Com o excesso acumulado de trabalho de
rotina, sai, naturalmente, penalizado tudo o resto, a diferenciação e a
investigação, que deveriam ser fulcrais num hospital universitário e de ensino pré
e pós-graduado. E vai-se assistindo a uma debandada de profissionais, mostrando
outros pouca apetência para os substituir, seja como formadores seja como
formandos.
Quer dizer, duma fusão de dois Hospitais,
feita sem qualquer necessidade ou indicação, e sem nenhum plano, resultou a
destruição de um e a deterioração do funcionamento do outro, com afastamento de
profissionais, de formandos e de doentes. E que levou a uma verdadeira crise no
SNS hospitalar em Coimbra, com repercussão na Região Centro. Com manifestações
populares por causa disso, exigindo o que tinham anteriormente a essa fusão. Isto
é evidente para todos, menos, ao que parece, para os responsáveis pela gestão
da saúde e pela situação criada. Que teimosamente insistem nela. E que acham
que falar no passado não adianta… quando o penoso presente resulta de em apenas
nove anos terem destruído a riqueza duma herança de quarenta e cinco!...
Se alguém pensa que a democracia consiste
em votar de quatro em quatro anos, está enganado. Se acharem que de quatro em
quatro anos se vota numa ditadura para esses anos, estão enganados. Quem
governa tem de estar constantemente atento às necessidades das pessoas, aos
seus anseios, às suas dificuldades, e tomar atempadamente as medidas
necessárias. Com clareza e limpidez. Em democracia, se os políticos desprezarem
o povo, o povo rapidamente se afastará deles. Como dizia Mário Soares, o povo
tem direito à indignação. E é indignação o que em Coimbra se tem gritado alto e
bom som, sobre uma fusão que desmantelou um Hospital público e colocou outro em
dificuldades. Alguns políticos há muito que a ouviram, outros fazem que não a
ouvem. Veremos até quando.
Essa indignação tem sido bem transmitida
pelos meios de comunicação locais, jornais e rádios, que têm desempenhado o seu
papel de informar, de modo empenhado e profissional, sobre o que se passa na
Saúde hospitalar em Coimbra. Mas a que os meios de comunicação social nacional
não querem dar relevo, e nem sequer noticiam, como se o que se passa nos
Hospitais do SNS em Coimbra fosse algo que pouco afecta ou interessa o país. Ou
foi o que lhes disseram. Claro que se fosse um médico acusado de qualquer coisa
isso seria notícia em todos os noticiários durante um dia ou dois, pelo menos!
Dizia Joseph Pulitzer, extraordinário jornalista americano falecido em 1911 e
cujo nome foi dado a um prémio mundial de grande prestígio para o jornalismo de
qualidade: “Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta
formará um público tão vil como ela mesma”. Esta profecia foi feita há mais de
110 anos… Felizmente que há jornalistas que lhe vão resistindo.